Dou cordiais boas-vindas a senhora Immaculèe Ilibagiza, que sobreviveu, miraculosamente, ao genocídio ocorrido em Ruanda, em 1994. Emigrou para os Estados Unidos e trabalhou nas Nações Unidas (ONU). É mãe de dois filhos e, atualmente, se dedica à Fundação que traz o seu nome: Fundação Ilibagiza, dedicada a ajudar outros sobreviventes a se recuperarem dos efeitos traumáticos produzidos pela guerra. Sua sobrevivência é obra da divina providência que preservou sua vida para que pudesse contar sua história e os horrores da guerra e lutar por um mundo mais justo, sem discriminação, sem ódio, sem violência, no qual todos possam viver como filhos de Deus e irmãos uns dos outros. Seja bem-vinda, senhora Immaculèe Ilibagiza, e que Nossa Senhora Aparecida proteja a senhora, sua família e o seu trabalho pela paz.
Em outubro de 1717, três simples pescadores foram mandados ao rio Paraíba a fim de trazer peixes para o Conde de Assumar que iria passar por Guaratinguetá a caminho da Capitania de Minas Gerais, então pertencente a capitania de São Paulo. Após lançarem a rede várias vezes, sem nenhum resultado, ao chegarem com sua canoas ao Porto de Itaguaçu, um dos pescadores, João Alves, lançou novamente a rede e tirou das águas o corpo de uma imagem, sem cabeça. Lançando a rede mais abaixo, outra vez, retirou a cabeça da mesma imagem. Era uma estátua da Imaculada Conceição que ninguém sabe como fora parar ali. Ao continuar a pescaria, não tendo até então apanhado nenhum peixe, dali por diante foi tão copiosa a pescaria que os três pescadores admirados do sucesso, viram na pesca e no encontro da imagem um sinal da proteção do céu, da Senhora da Conceição, representada naquela imagem de terracota, pequena e escura. Felipe Pedroso recolheu, com respeito, a pequenina imagem, envolveu-a em um pano e a levou para a casa. Mais tarde, foi levada para um oratório, no Porto de Itaguaçu, onde começou a devoção a Nossa Senhora da Conceição, que, logo foi chamada, carinhosamente, de Nossa Senhora Aparecida.
Vinte e seis anos mais tarde, no dia 05 de maio de 1743, Dom Frei João da Cruz, Bispo da Diocese do Rio de Janeiro, que na época abrangia a Capitania de São Paulo e quase toda a de Minas Gerais, assinou em Mariana, antiga vila do Ribeirão do Carmo, o decreto canônico, erigindo a Capela de Nossa Senhora da Conceição Aparecida. Dois anos mais tarde, o mesmo Dom Frei João da Cruz, achando-se em Mariana, novamente, em preparativos para a criação da Diocese de Mariana e ciente de já haver sido edificada, no alto do Morro dos Coqueiros, a capela de Aparecida, autorizou por provisão do dia 22 de maio de 1745, a sua bênção litúrgica e o culto divino da mesma. (cf. Oliveira, Oscar. Virgem Maria: Mãe de Deus e Mãe dos Homens. Mariana: Editora Dom Viçoso, 1968, p. 151).
Quase dois séculos mais tarde, a pequena Capela foi substituída pela atual Matriz Basílica que foi sagrada e inaugurada no dia 08 de setembro de 1909, por Dom Duarte Leopoldo e Silva, Arcebispo de São Paulo. Com o fluxo de romeiros cada vez mais numeroso, tornou-se necessário a construção de um novo templo, com capacidade para acolher um maior número de romeiros.
No dia 11 de novembro de 1955, com a bênção do senhor Cardeal Carlos Carmelo de Vasconcelos Motta, Arcebispo de São Paulo, iniciou-se a construção deste grandioso Santuário, projetado pelo arquiteto Benedito Calixto. No dia 04 de julho de 1980, o Papa João Paulo II, em sua 1ª visita ao Brasil, fez a sagração deste magnífico templo, cuja construção tem sido levada adiante graças a colaboração generosa dos devotos de Nossa Senhora Aparecida e ao zelo pastoral incansável dos missionários redentoristas que, desde 28 de outubro de 1894, a pedido de Dom Lino de Carvalho Deodato, 8º. Bispo de São Paulo, assumiram o cuidado pastoral do Santuário.
Hoje, são mais de 10 milhões de devotos de Nossa Senhora Aparecida que visitam este Santuário e, com a Rede Aparecida de Comunicação, este Santuário, parafraseando o Papa João Paulo II, “se converteu, não só para os romeiros, mas também, para o Brasil, em antena permanente da boa nova da salvação.”
Os textos das leituras que acabamos de escutar nos fazem referência ao tema da festa da Padroeira, deste ano: “Senhora Aparecida, reflexo do coração materno de Deus”.
Ester, órfã de pai e mãe, foi eleita esposa do rei Assuero, rei da Pérsia e pela sua beleza, prudência e sua confiança em Deus, obteve a libertação do povo judeu que tinha sido condenado ao extermínio por um edito real. A tradição cristã viu no papel desempenhado por Ester em favor do seu povo, a prefiguração de Maria, na sua função materna e de advogada nossa diante de Deus. Esta confiança na missão de Maria de defensora do povo cristão foi expressa na primeira oração mariana, composta no Egito, no século 3º.: “Sob a vossa proteção nós nos refugiamos, ó Santa Mãe de Deus. Não desprezeis nossas súplicas, mas livrai-nos de todos os perigos, Virgem gloriosa e bendita”. No decorrer dos séculos, Nossa Senhora tem sido sempre invocada pelos cristãos em suas súplicas, sobretudo, nos momentos difíceis. Diante de Cristo, mediador entre Deus e os homens, Maria é a nossa mãe que está continuamente intercedendo por nós seus filhos. Se os santos podem interceder em nosso favor, com maior razão a Virgem Maria, mãe de Deus e nossa mãe!
No evangelho, São João faz referência a um casamento em Caná da Galiléia e destaca, neste episódio, a presença da mãe de Jesus, do próprio Jesus e de seus discípulos. Durante o banquete o vinho veio a faltar. Quem dá conta da situação de angústia dos noivos é Maria e ela apenas diz a Jesus: “Eles não têm mais vinho”. A resposta de Jesus parece de indiferença à preocupação de Maria. “Mulher, porque me dizes isso a mim? Minha hora ainda não chegou”. A resposta de Jesus é um semitismo, isto é, uma maneira normal da época de se dirigir as mulheres, como vemos no diálogo com a mulher adúltera; no diálogo com a Samaritana; e a mesma expressão é usada também por ele, no Calvário, quando se dirige a Maria ao pé da cruz: “Mulher, eis aí teu Filho.”
A hora de Jesus, no evangelho de João, é a hora de sua glorificação definitiva, de sua volta ao Pai após sua morte e ressurreição, por isso, ele diz que sua hora ainda não chegou. Maria compreende o significado profundo da resposta de Jesus, e sua hora fixada pelo Pai não será antecipada. Maria, porém, com plena confiança e esperança de que seu Filho haveria de resolver a situação, diz aos serventes: “Fazei tudo o que vos disser”. Este primeiro milagre que se realizou, no inicio de sua vida pública, a pedido de Maria, é o anúncio simbólico da hora de Jesus, da manifestação da sua glória e os seus discípulos creram nele.
Maria é o reflexo humano do coração materno de Deus. Por isso, os fiéis recorrem a ela com tanta devoção, pois sentem intuitivamente este amor materno. Sabem que Maria compreende sua dor e seus desejos, entende suas limitações. Reconhecem em Maria a nossa irmã, que viveu como perfeita discípula de Jesus com esperança e coragem. Reverenciam a Senhora Aparecida como Mãe nossa, que reúne os filhos e filhas debaixo de seu imenso manto. Pois o povo costuma dizer: “em coração de mãe sempre cabe mais um filho”. No cuidado e na ternura de Maria se reflete a bondade de Deus. No seu canto, chamado “Magnificat”, ressoa a voz do Deus que olha com carinho especial para os pobres e injustiçados deste mundo.
Podemos dizer, com certeza: Maria é reflexo do amor de Deus. Ela não é fonte. Por isso, no culto católico, Nossa Senhora não ocupa o lugar de Jesus, que é o único mediador entre Deus e a humanidade, como afirma São Paulo, na primeira epístola a Timóteo. Maria consegue as graças que pedimos, mas é Deus que as concede.
Hoje, dia da Padroeira e Rainha do Brasil, rogamos à Mãe de Deus, Nossa Senhora da Conceição Aparecida, que cuide de nosso amado e continental país, que foi confiado à sua proteção como Padroeira principal de nossa Nação Brasileira e de sua boa gente. Que a Senhora Aparecida faça crescer em todos nós a fé em Jesus, o compromisso de anunciá-Lo aos nossos irmãos, a consciência cidadã, a responsabilidade de cuidar também dos mais fracos e de proteger o meio ambiente.
Confiantes, suplicamos à Mãe de Jesus que faça de cada um de nós e das nossas comunidades, reflexo da misericórdia de Deus. Alegres, recorremos à Mãe Aparecida, dizendo: “Maria, reflexo do coração materno de Deus”, rogai por nós. Amém!
Dom Raymundo Damasceno Assis
Cardeal Arcebispo de Aparecida, SP
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